Onde usar a palavra "onde", onde não usá-la.
Onde é uma daquelas palavras que usamos o tempo todo e, por isso mesmo, podem vir a ser empregadas um pouco fora de seu sentido próprio, o que é inadequando tem textos formais.
Você está conversando com um conhecido e ele diz:
– Eu estava vendo um filme muito bom onde...
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Em teses e dissertações, como em todos os textos que requerem uso formal da língua escrita, os termos devem ser aplicados em seu sentido próprio, descartados os empregos coloquiais que eles tenham. |
Qual seria o complemento da frase? Se adequado gramaticalmente, o complemento deveria dar a informação do LOCAL onde o seu amigo estava quando via o filme, não o assunto de que tratava o filme, conforme o seguinte exemplo:
– Eu estava vendo um filme muito bom onde nos encontramos semana passada, naquele cinema lá no centro da cidade.
O uso de “onde” tornou-se verdadeiro quebra-galho linguístico, visto que algumas pessoas usam-no
para quase tudo. Certas gramáticas brasileiras de língua portuguesa definem “onde” como “pronome relativo invariável”, como “advérbio relativo” ou ainda “advérbio interrogativo de lugar”, dependendo de sua posição. Seja lá qual for a nomenclatura gramatical utilizada para classificar tal palavra, é sabido que seu uso está restrito à noção de lugar. Ou seja, se fizermos a troca de “onde” por “local em que/ lugar em que” veremos que funciona da mesma forma:
- Estava na casa dela, onde a mãe nos vigiava enquanto conversávamos;
- Moro onde mais me agrada;
- Fica ali a encruzilhada onde ergueram uma cruz de madeira;
- Onde dormirão os hóspedes?
Nos exemplos acima, vemos que tal vocábulo, uma vez analisado sob as acepções semânticas referentes ao contexto em questão, está empregado adequadamente, já que nas situações descritas prevalece o sentido de “lugar”.
No entanto, é observável que nem sempre isso acontece e, muitas vezes, nos deparamos com algumas situações nas quais o usuário acaba aplicando incorretamente o padrão formal da linguagem e cometendo alguns tipos de deslizes. Como já mencionamos, apesar de a norma (padrão), a presente nas grandes gramáticas, restringir a utilização de “onde” a aspectos relativos a lugar, local, seu uso tem sido visto em uma infinidade de situações inadequadas, geralmente informais. Os exemplos abaixo exibem o uso errado de “onde”, que pode ser uma verdadeira muleta linguística, caso seja usado indiscriminadamente. É possível perceber que nesses próximos exemplos, a troca de “onde” por local em que/ lugar em que não é possível.
- Fez uma emocionante declaração de amor, onde ficava clara a vontade de namorá-la.
- Quais são as modalidades onde seu irmão é campeão?
- Vamos assistir a uma peça americana, onde João faz um pequeno papel.
- Focalizarão o grupo de crianças onde a doença foi detectada.
Assim, vemos que quando não houver a indicação de lugar físico, espacial, deve-se preferir o uso de “em que”, “no qual” (e suas flexões na qual, nos quais, nas quais). Visto isso, se nos referimos a uma situação, a um filme, a uma decisão, a um dia, uma pessoa, uma ação, é inadequado empregar “onde”, uma vez que esses substantivos não são lugares. Esse tipo de construção caracteriza-se pela falta de coesão. Os elementos articuladores (preposições, conjunções, pronomes) devem reforçar ou mesmo tornar clara a relação semântica que se pretende estabelecer entre os termos da oração, entre as orações ou entre as partes de um texto. Em outras palavras, o “onde” retoma termos que se referem a lugares. Na linguagem coloquial, é muito comum que se perceba o uso das duas formas indiscriminadamente, o que deve ser evitado segundo a norma culta e utilizado com a devida atenção em textos formais.
Os exemplos citados anteriormente estariam então adequados se escritos seguinte maneira:
- Fez uma emocionante declaração de amor, na qual ficava claro a vontade de namorá-la.
- Quais são as modalidades nas quais seu irmão é campeão?
- Vamos assistir a uma peça americana, em que João faz um pequeno papel.
- Focalizarão o grupo de crianças no qual a doença foi detectada.
Mais alguns exemplos do uso adequado do vocábulo:
- Vivemos uma época muito triste, na qual a violência gratuita impera.
- É difícil viver em um ambiente no qual as pessoas não se respeitam mutuamente.
- Durante a apresentação, houve um momento em que todos tiveram a oportunidade de interagir com os dançarinos.
Facilmente, podemos constatar que o uso inadequado de tal palavra, tratando-se da situação comunicativa em questão, que retrata claramente os frequentes “deslizes” cometidos por todos nós, falantes da língua portuguesa. Devemos entender que o problema é o simples fato de a palavra “onde” ser utilizada em um caso que somente caberia o emprego de um pronome relativo, cuja função se define por retomar um termo anteriormente mencionado. Partindo desse princípio, cabe a nós atribuir ao termo aqui retratado o significado que lhe é necessário, de modo a fazer o bom uso que a ele se concede. Sendo relativamente constante o uso incorreto do “onde”, vejamos outro fragmento, extraído de uma crônica:
- Era o mesmo entre gregos e romanos e será difícil encontrar um povo onde a sogra não seja tema de irritação e brigas constantes.
- Só uma humanidade onde reine o amor poderá gozar da paz autêntica e duradoura.
Mais uma vez, o problema está no fato de o termo “onde” retomar uma palavra que não indica lugar, no caso “povo” e “humanidade”. Em ambos os casos, o vocábulo novamente poderia ser substituído pelas formações em que/no qual/na qual. Uma parte da confusão nasce da crença na equivalência entre “onde” e “em que”. É verdade que “onde” pode ser substituído por “em que” (“cidade onde nasci” ou “cidade em que nasci”, por exemplo), mas o inverso nem sempre é possível e aplicável. Alguns exemplos desse equívoco podem ser verificados a seguir:
- A advogada se apresentou na reunião da bancada de parlamentares nesta quarta, na Câmara dos Deputados, onde senadores e deputados trataram dos investimentos futuros do estado.
- O projeto aguarda a aprovação do relator na Comissão de Assuntos Especiais (CAE), onde receberá decisão enfim definitiva.

Antigamente, na língua portuguesa, empregava-se o relativo “onde’ em construções hoje já esquecidas na variante da língua padrão, enquanto outros tipos de empregos ainda vigentes na modalidade coloquial ou popular, segundo estudiosos da língua, devem ter o nosso “onde” substituído obrigatoriamente pelas formas relativas compostas em que/no qual/na qual/nos quais/nas quais, quando o termo não se referir a lugar físico – como já dizemos e reforçamos. A rigor, não se trata de um erro de gramática, mas de uma forma de uso que pode comprometer a clareza e a qualidade da exposição das ideias, uma vez que pode oferecer dúvida na interpretação imediata da frase. Isto ocorre com muita frequência quando uma forma gramatical é dotada da possibilidade de exprimir mais de uma noção. Por este motivo, normalmente, não encontramos condenação do uso do “onde” nessas circunstâncias.
O revisor de textos está atento a tudo que foi listado e, de quebra, por fazer uma leitura crítica, é capaz de apontar incoerências e sugerir caminhos alternativos ou tons diferentes para uma argumentação, seja num texto simples ou em uma complicada tese. Então, caso queira ter certeza da precisão do trabalho escrito e evitar pequenos erros como esse e outros tão mais complicados e que prejudicá-lo fortemente, entregue-o nas mãos de um bom profissional da área em questão.